LG. LUÍS DE CAMÕES, LISBOA - 2 DE ABRIL 15:20 / 16:20

A utilização da planta da canábis pelo ser humano não é nova, pelo contrário! Estudos científicos descobriram as suas origens em fósseis no Tibete, datados de há mais de 27 milhões de anos, e a sua utilização medicinal remonta a pelo menos 6.000 a.c., na China.

 

Portugal tem uma forte relação histórica com o cânhamo, cultivado há centenas de anos para ser utilizado na produção de velas e cordas para as caravelas dos Descobrimentos, além do vestuário dos militares e da forragem para animais, entre outros usos.

 

Actualmente, a ciência já comprovou o potencial terapêutico desta planta, graças à descoberta, no início dos anos 90, do Sistema Endocanabinóide, responsável pela homeostase (equilíbrio) do corpo humano e da maior parte dos animais. Mas além dos benefícios terapêuticos, a canábis, nomeadamente a sua variedade industrial, o cânhamo, é uma cultura sustentável (carbono negativa), já enaltecida pela ONU e pela Comissão Europeia, pelo seu papel preponderante na economia, na sociedade e na sustentabilidade do planeta. 

 

O cânhamo industrial, que tem menos de 0,3% de THC e por isso não é psicotrópico, serve para a produção de inúmeros produtos, como sementes e óleos para alimentação, vestuário, fibras, papel, plásticos, casas e até combustível, tudo biodegradável, entre muitos outros usos. 

 

A raiz do cânhamo também é capaz de limpar os solos, tendo já sido utilizada com sucesso na descontaminação dos terrenos à volta do local do acidente nuclear de Chernobyl. 

 

Todos estes usos, no mundo em que vivemos hoje, estão a incentivar a economia, a revitalizar comunidades locais, a gerar empregos e, inclusive, a ajudar a superar crises em muitos países do mundo, que agora se voltam para a canábis como uma nova esperança para a humanidade, abandonando em definitivo uma cultura de proibição, que escondeu e distorceu a verdade sobre esta planta milenar.

 

Em Portugal, muitos pacientes, incluindo crianças, já utilizam, com sucesso, óleos derivados das flores do cânhamo e da canábis, ricas em canabidiol (CBD), tetrahidrocanabinol (THC) e muitos outros canabinóides, para ajudar no tratamento de patologias como a epilepsia, o autismo, a esclerose múltipla ou o cancro, entre muitas outras.

  

No entanto, e apesar de Portugal ser um dos maiores produtores de canábis do mundo, só três derivados de canábis estão disponíveis no mercado português. Além disso, a maioria dos médicos ainda não está a prescrever, porque o Sistema Endocanabinóide não é incluído nos currículos das Faculdades de Medicina. 

 

É urgente avançar com a educação dos profissionais de saúde e da sociedade em geral, quebrando estigmas e preconceitos. 

 

É necessária menos proibição e mais clareza nas leis, facilitando o acesso a quem pode beneficiar da utilização da canábis e a desburocratizar o cultivo do cânhamo, respeitando o que vários tribunais europeus já reiteraram: a livre circulação da planta inteira do cânhamo, incluindo as suas flores, não pode ser proibida nos Estados Membros da União Europeia.

 

Também o auto-cultivo para consumo pessoal, a única forma de acesso para muitos, que não têm poder económico para comportar os custos avultados dos derivados de cannabis, tem de ser garantido como um direito humano. 

 

Não basta autorizar a venda de apenas medicamentos ou só uma parte da planta, quando as outras também são terapêuticas para muitas crianças, jovens, adultos e idosos do nosso país. 

 

Não se pode dizer que a produção de flores de cânhamo é ilegal em Portugal, quando um tribunal português já obrigou a Polícia Judiciária a devolver flores de cânhamo a um comerciante, já que não são consideradas um narcótico. 

 

Para uma regulamentação da canábis sensata e inclusiva, que respeite todas as pessoas e a equidade, é indispensável escutar e atender à necessidade dos pacientes, respeitando direitos fundamentais e liberdades, e garantido também o seu acesso à saúde, consagrado na Constituição da República Portuguesa. 

 

O MANIFESTO DA MARCHA PELA CANÁBIS RESUME-SE A 10 REIVINDICAÇÕES ESSENCIAIS:

1. Cumprimento Direito à Saúde por parte do Estado Português, facilitando a formação dos profissionais de saúde, prevista na Lei 33/2018, incluindo a introdução da Canábis Medicinal e do Sistema Endocanabinóide nos currículos das Faculdades de Medicina, de forma a garantir o conhecimento dos avanços da ciência e o acesso seguro de todos às terapêuticas com canábis;

2. Aumentar a disponibilidade de medicamentos, substâncias e preparações de canábis nas farmácias, obrigando as empresas produtoras de canábis em território português a requerer obrigatoriamente ACM’s (Autorização de Colocação no Mercado) para os seus derivados de canábis, de forma a que as estas não se dediquem apenas à exportação; 

3. Alargar a lista de indicações terapêuticas previstas pelo Infarmed, revendo a literatura científica existente, e considerar a canábis como possível tratamento de 1ª linha ou complementar aos tratamentos convencionais, incluindo para os menores de 21 anos, que actualmente estão excluídos de possíveis tratamentos com THC. 

A ciência comprovou, sistematicamente, o alto perfil de segurança dos canabinóides, com poucos efeitos adversos e sem provocar dependência física, principalmente se comparados com opióides ou benzodiazepinas; vários estudos já demonstraram, aliás, que o CBD pode não só ajudar a tratar dependências de outras substâncias (como medicamentos, álcool ou tabaco) como tratar psicoses, ao invés do que tem sido propagado por quem ainda não estudou o assunto;

4. Reconhecer urgentemente o direito ao cultivo pessoal e associativo de canábis como única forma de acesso para muitos doentes residentes em Portugal, conforme já aconteceu com várias associações de pacientes de outros países;

5. Respeitar o direito à liberdade de escolha e à autonomia sobre o próprio corpo, autorizando o cultivo pessoal para consumo próprio aos adultos em seu perfeito juízo, pois estes não podem continuar à mercê de redes de tráfico de droga ou de mercados paralelos não regulamentados, onde existem substâncias muito mais perigosas, manipuladas (como os canabinóides sintéticos) ou o “consumo desinformado”. 

Os cidadãos não podem também continuar a permitir a perseguição e a interferência das autoridades na esfera da sua vida privada ou ser alvo de ridicularização ou falsos moralismos. 

Todos sabemos que o álcool e o tabaco matam, a canábis não! 

6. Investir em programas de prevenção de riscos e redução de danos, que levem mais e melhor informação sobre canábis à sociedade portuguesa, principalmente aos jovens;

7. Incentivar a economia local e a sustentabilidade através da promoção do cultivo do cânhamo e da utilização de todas as partes da planta, não só a fibra e as sementes, e difundir a sua importância na sustentabilidade do país e do planeta;

8. Rever urgentemente a Portaria que impede os pequenos agricultores de investir no cânhamo industrial, por ser discriminatória e desincentivar a agricultura e a economia local. Isto não acontece com outras espécies, como o milho, o azeite ou os girassóis.  

9. Regulamentar de forma clara, inclusiva e independente todos os potenciais negócios do ramo, nomeadamente o comércio do cânhamo e seus derivados, que neste momento se encontra numa área cinzenta da lei, em que não é proibido (pois há dezenas de lojas abertas ao público por todo o país), mas também não está devidamente regulamentado, levando, muitas vezes, a fiscalizações e apreensões indevidas, que culminaram no tribunal a obrigar a Polícia Judiciária a devolver flores de cânhamo a um comerciante.

10. Por fim, e devido à especificidade da questão, criar um gabinete independente para assuntos relacionados com a canábis e o cânhamo, com representação de todos as associações, intervenientes e sectores transversais à utilização da planta.

uma organização: